
2017 Charles Bradley
Assinala-se hoje o aniversário da morte de Charles Bradley, cantor que encontrou na soul a forma mais verdadeira de se expressar e que, mesmo partindo tarde para os grandes palcos, deixou uma marca que continua viva.
Durante grande parte da sua vida, Bradley cantou nos cantos mais pequenos, muitas vezes como imitador de James Brown, o seu ídolo e maior influência. Daí herdou não só alguns maneirismos vocais e gestuais, mas sobretudo a energia em palco, aquela entrega que fazia da música um ato total, físico e espiritual. Mas quando chegou a sua vez de ser reconhecido como artista em nome próprio, já não era apenas “um imitador”: era alguém que tinha encontrado uma voz singular, feita de sofrimento transformado em intensidade emocional.
Quem assistiu a concertos seus, seja em festivais europeus, seja em clubes norte-americanos, recorda um artista que se dava por inteiro. Bradley descia muitas vezes do palco para abraçar o público, num gesto simples mas profundamente revelador: a soul, para ele, era partilha e proximidade.
Na sua passagem por Portugal, deixou atuações que ainda hoje são lembradas pela crueza e entrega absoluta. Não havia distâncias entre músico e plateia, apenas a sensação de que todos estavam a viver, juntos, algo único.
A discografia que Charles Bradley nos deixou é curta, mas intensa. Em cada canção sente-se o peso de uma vida dura e a capacidade rara de transformar dor em beleza. Bradley não precisou de muitos anos de fama para conquistar o seu espaço na soul moderna: bastou-lhe ser verdadeiro.
Neste dia em que recordamos a sua partida, mais do que lamentar a perda, celebramos a forma como conseguiu, mesmo no fim da vida, cumprir um destino artístico que parecia adiado. Charles Bradley provou que a música pode florescer em qualquer idade e que, quando nasce de uma verdade interior, tem força para atravessar o tempo.
Playlist obrigatória
1. “The World (Is Going Up in Flames)” – No Time for Dreaming (2011)
O ponto de partida obrigatório. Foi com esta canção que Bradley se apresentou ao mundo. Uma mensagem social de urgência, cantada com uma intensidade quase profética. Ideal para abrir a playlist e sentir logo a dimensão da sua voz.
2. “Heartaches and Pain” – No Time for Dreaming (2011)
Aqui ouvimos Bradley na sua versão mais pessoal e dolorosa. Inspirada na morte do irmão, é uma canção que mostra como a sua música estava profundamente ligada à sua biografia.
3. “No Time for Dreaming” – No Time for Dreaming (2011)
A faixa-título do disco de estreia reforça a ideia de que a sua soul era feita de urgência e verdade. Um hino de resiliência, que fecha simbolicamente este primeiro capítulo da playlist.
4. “Strictly Reserved for You” – Victim of Love (2013)
Mais leve e romântica, mostra um lado mais luminoso de Bradley. Frequentemente recebida em concerto com sorrisos e braços no ar, é uma pausa de calor e ternura na sua discografia.
5. “Victim of Love” – Victim of Love (2013)
A canção que dá título ao segundo álbum. Aqui, Bradley aproxima-se da tradição clássica da soul, cantando sobre amor e redenção com uma entrega que o distingue de qualquer revivalismo.
6. “Confusion” – Victim of Love (2013)
Um dos temas em que mais claramente se nota a influência de James Brown, tanto no groove como na forma intensa e explosiva de cantar. Uma ponte direta entre passado e presente da soul.
7. “Changes” – Changes (2016)
O momento de maior ousadia: a sua versão do clássico dos Black Sabbath. Bradley transforma a balada rock em lamento soul, cheio de dor e esperança. Um dos pontos altos da playlist.
8. “Ain’t It a Sin” – Changes (2016)
Energia pura. Esta canção, muitas vezes usada para abrir concertos, é a demonstração da sua força em palco, com uma interpretação que parecia rasgar cada sílaba.
9. “Good to Be Back Home” – Changes (2016)
Um fecho caloroso e otimista. É quase um agradecimento aos palcos, aos fãs e à vida que, apesar de tardia, lhe deu finalmente o espaço para ser ouvido. Termina a playlist num tom de celebração e gratidão.